Tribunal alinhado a Maduro o declara vencedor e proíbe divulgação das atas

O Tribunal Supremo de Justiça da Venezuela (TSJ), a mais alta Corte do país, que é alinhada ao regime de Nicolás Maduro, declarou nesta quinta-feira (22) reconhecer a reeleição do presidente venezuelano na votação de 28 de julho.

O TSJ venezuelano também proibiu a divulgação das atas eleitorais, que indicam o resultado da votação por zona eleitoral. A publicação das atas, que comprovariam o resultado do pleito, vinha sendo cobrada pela oposição e pela comunidade internacional. Segundo o próprio TSJ, a decisão da Corte é “inapelável”.

O Tribunal Supremo também considerou que o candidato da oposição, Edmundo González, está sujeito a sanções por cometer o que foi considerado desacato à Justiça ao não comparecer a audiências convocadas pelo Judiciário após a eleição.

Com a decisão, a Corte, considerada um braço do chavismo no Judiciário, referendou, 25 dias depois da eleição, o resultado anunciado pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE). O conselho é o equivalente à Justiça eleitoral do país e também está sob o comando de um aliado de Maduro.

O CNE havia proclamado a vitória de Maduro no dia seguinte à votação, em 29 de julho, e outra vez dias depois, no início de agosto. No entanto, as atas eleitorais nunca foram publicadas.

Oposição questiona decisão

A oposição contestou a decisão do tribunal desta quinta. O candidato oposicionista Edmundo González publicou em suas redes sociais uma montagem com a palavra “nula” em cima de uma sentença do TSJ. “A soberania reside intransferivelmente no povo”, declarou.

“O país e o mundo conhecem sua parcialidade [do TSJ] e, por extensão, sua incapacidade de resolver o conflito; sua decisão só agravará a crise”, escreveu González antes da divulgação da sentença.

A equipe de María Corina Machado, líder opositora que teve sua candidatura barrada antes da oficialização do nome de González na disputa, disse ao g1 que está estudando como e quando responderá à sentença.

Antes da decisão, o Conselho de Direitos Humanos da ONU afirmou haver “falta de independência e imparcialidade de ambas as instituições (TSJ e CNE)”.

Sentença resulta de suposta auditoria

A sentença é a conclusão de uma suposta auditoria que o Supremo informa ter feito com base nas atas eleitorais a pedido do próprio Nicolás Maduro. O pedido do presidente foi feito após a oposição, a ONU e governos de diversos países contestarem a proclamação da vitória dele sem a divulgação das atas.

As atas também não foram publicadas pelo tribunal, que determinou, na mesma sentença, que “todo o material eleitoral (incluindo as atas eleitorais) ficará sob controle do Tribunal Supremo”.

Sem possibilidade de recurso

A presidente do tribunal, Caryslia Rodriguez, afirmou que a decisão é irreversível. Ou seja, não cabem recursos à sentença desta quinta. Quem contestá-la, disseram os juízes, não poderão concorrer nas próximas eleições.

“O material eleitoral avaliado está certificado de forma inquestionável, e os resultados da eleição presidencial de 28 de julho divulgados pelo Conselho Eleitoral Nacional, nos quais Nicolás Maduro foi eleito presidente da república, estão validados”, diz a sentença.

Sanções a Edmundo González

Os juízes também disseram entender que, como não compareceu a audiências convocadas pelo tribunal, o candidato oposicionista, Edmundo González, desacatou a Justiça ao não comparecer a audiências às quais havia sido convocado e, por isso, estará sujeito a sanções.

A juíza Caryslia Rodríguez, que leu a sentença, não informou se haverá e quais podem ser as sanções contra González. Quando deixou de comparecer às audiências, o oposicionista alegou que não tinha sido formalmente notificado e que temia ser preso ao chegar ao tribunal.

Rodríguez disse ainda que os juízes também constataram que houve de fato um ataque cibernético ao sistema que registra os votos da Justiça eleitoral, o que, segundo o tribunal, atrasou a divulgação das atas eleitorais.

Há duas semanas, o Centro Carter, instituto norte-americano convidado para participar como observador nas eleições venezuelanas, afirmou não ter visto indícios de um ataque hacker após inspeção ao sistema de votação.

Oposição já havia dito não reconhecer decisão do tribunal

A coalizão opositora da Venezuela já havia informado no dia anterior (21) que não reconheceria nenhuma decisão da Suprema Corte do país acerca do resultado da eleição ocorrida no último dia 28 de julho.

De acordo com a oposição, “a Sala Eleitoral do Tribunal Supremo de Justiça não pode atribuir a si mesma as funções e faculdades do órgão eleitoral, pois não lhe competem”.

Com base em contagens rápidas e em uma contagem independente das atas, González e a coalizão opositora se declararam vencedores das eleições. A comunidade internacional e observadores apontaram a falta de transparência do processo de apuração da Venezuela e pressionaram o regime Nicolás Maduro pela divulgação oficial das atas.

A ONU alerta para a influência indiscriminada de Maduro e de Diosdado Cabello, homem forte do chavismo, no TSJ. Ela aponta também que a presidente da Corte é membro do partido de Maduro, e que o atual presidente do CNE é um ex-membro da mesma sigla.

Validação das atas

Na última segunda-feira, magistrados da Suprema Corte da Venezuela, acompanhados por especialistas e observadores internacionais, compareceram às instalações do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), em Caracas, para iniciar a suposta validação das atas de votação das eleições presidenciais de 28 de julho.

Em uma rede social, a oposição da Venezuela disse que partidos que compõem a unidade não foram informados da perícia e não estiveram presentes no local onde o processo é feito.

Segundo a agência de notícias Reuters, as autoridades foram levadas à área de gestão do Centro de Totalização, onde, com o apoio de técnicos do CNE, começaram a verificar se as atas eleitorais coincidem com os registros digitais para verificar se os resultados estão corretos.

O processo, registrado pela TV governamental venezuelana, começou um dia após a oposição política da Venezuela e seus apoiadores se reunirem em cidades por todo o país para exigir o reconhecimento da vitória de González, que eles classificam como “retumbante”.

Um dia depois da votação, o CNE, autoridade eleitoral do país, tinha anunciado que o presidente Nicolás Maduro conquistou seu terceiro mandato na disputa com pouco menos de 52% dos votos.

Pressão internacional

Em uma carta enviada ao presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, 30 ex-chefes de Estado afirmam que Nicolás Maduro está buscando ganhar tempo e se aproveita do controle que tem sobre as autoridades venezuelanas para permanecer no poder. Além disso, o grupo rejeitou a ideia de novas eleições no país.

O documento foi assinado em 16 de agosto por integrantes do grupo Ideia. Entre os membros da organização estão os ex-presidentes Álvaro Uribe, da Colômbia, Guillermo Lasso, do Equador, e Maurício Macri, da Argentina.

“É possível repetir eleições ou promover a convivência dos venezuelanos, um povo decente e vítima das suas forças democráticas, com os responsáveis ​​pela execução de crimes contra a humanidade investigados e em fase final pelo Tribunal Penal Internacional?”, afirma o grupo.

Lula sugeriu novas eleições

A ideia de novas eleições foi ventilada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e apoiada por Gustavo Petro, da Colômbia. Biden foi questionado sobre a sugestão e chegou a dizer que concordava. Depois, a Casa Branca esclareceu que o norte-americano não tinha entendido a pergunta.

Na carta, os ex-chefes de Estado elogiaram a decisão de Biden de não reconhecer a vitória de Nicolás Maduro, além de não ter aceitado a proposta de um novo pleito.

O grupo denunciou que o regime de Maduro está reprimindo as forças democráticas e o povo venezuelano de forma indiscriminada, o que representa um “verdadeiro ataque ao direito democrático interamericano”.

No dia 5 de agosto, os ex-chefes de Estado também enviaram uma carta a Lula, pedindo para que o presidente assegure o compromisso com a democracia na Venezuela e pressione Caracas.

A Organização dos Estados Americanos (OEA) aprovou uma resolução exigindo que a Venezuela publique as atas com o resultado das eleições e um grupo composto por Estados Unidos, União Europeia e mais 21 países publicou uma declaração conjunta para pedir a divulgação das atas eleitorais pelo Conselho Nacional Eleitoral venezuelano.

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