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Montagem de ‘Dom Giovanni’ acerta ao preservar protagonista

A natureza opera segundo uma lei da generalidade. O maciço do Lubéron, que rodeia as cidadelas da Provence, região no sul da França, vai um dia se desintegrar em planícies de matéria orgânica indistinta.

O processo só se completará daqui a milênios, quando você não estiver mais aqui. Entre a vida e a morte, a natureza é regida por um modelo de perfeição. Assim também é a música do austríaco Wolfgang Amadeus Mozart, cuja gramática clássica oferece parâmetros para a sua escrita composicional.

A humanidade, porém, é imperfeita. Por mais que tenha se tentado impor uma lei geral da moralidade, o ser humano deixará sempre rastros de sua impureza por onde passar.

Em 1787, Mozart já compreendera tal ambivalência. Naquele ano, ele se uniu ao libretista italiano Lorenzo Da Ponte para compor a ópera “Dom Giovanni”, agora apresentada no Festival de Aix-en-Provence, uma das cidades vizinhas ao Lubéron.

A perfeição do período clássico está ali diante de um libreto, alicerçado na figura de um dissoluto punido, como diz a introdução do título da ópera, sempre esquecida nos cartazes. Dom Giovanni é, afinal, Dom Juan, figura arquetípica da literatura europeia, que apareceu, cem anos antes da ópera, numa peça do espanhol Tirso de Molina.

Ele é um homem libertino, de insaciável pulsão sexual, que seduz todas as mulheres e não se incomoda em usar a força a fim de consumar o seu desejo. Para contar sua história, a dupla Mozart e Da Ponte criou um “dramma giocoso”, uma mistura de drama e comédia.

A atual montagem é concebida por dois britânicos: Robert Icke, prodígio do teatro do Reino Unido, estreia na ópera com a regência de Simon Rattle, o maestro oficial da realeza. Ambos têm acertos evidentes.

Em primeiro lugar, Icke não quis mudar quem é Dom Giovanni. Não pintou o protagonista como um machista tóxico para ensinar valores ao público, mas tampouco minimizou a perversidade dele.

O Dom Giovanni de Icke não é superficial. Ao contrário, o diretor vê nele um pedófilo e chega a criar uma cena em que o personagem acaricia os cabelos de uma menina, com sugestões eróticas.

Da parte de Rattle, o maestro cumpre o que já era esperado: um trabalho impecável à frente de sua Orquestra Sinfônica da Rádio Bávara. Dividido em dois atos, a ópera se inicia com a cena em que Dom Giovanni, agora interpretado pelo barítono Andrè Schuen, seduz Dona Ana, papel da soprano Golda Schultz.

Ela foge para buscar ajuda, mas Dom Giovanni mata seu pai, o Comendador, vivido pelo baixo Clive Baylei. Até o fim do segundo ato, acompanhamos a caçada pelo criminoso Dom Giovanni, seguido de perto por seu aspone, Leporello, interpretado pelo baixo Krzysztof Baczyk.

Entre os perseguidores de Dom Giovanni, estão Dona Elvira, personagem da mezzo-soprano Magdalena Kozená, Zerlina, vivida pela soprano Madison Nonoa, vítimas do protagonista, além de Masetto, o noivo de Zerlina.

No elenco, se destacam Schuen, que tem o “physique du rôle” para ser o galanteador, Nonoa, cujo o desempenho na ária “Là Ci Darem La Mano” é inebriante, e Konzená, com uma Elvira desesperada e engraçada.

De inspiração minimalista, o palco é dividido em dois níveis que, no primeiro ato, formam o que poderia ser a casa de um milionário do Vale do Silício. No segundo, com Dom Giovanni ferido, a estrutura se transforma nas dependências de um hospital.

Na concepção de Icke, Dom Giovanni e o Comendador são a mesma pessoa. O pai de Dona Ana erra no palco como um fantasma, lembrando o protagonista de seu crime. Icke suspende a parte “giocosa” da ópera, deixando-a restrita ao libreto.

Opta por desenvolver, pouco a pouco, um “Dom Giovanni” sombrio, com sangue e escuridão, o que não deixa de ser uma leitura pertinente. Ocorre que os dois pontos fracos da montagem são ressaltados nessa mudança de encenação.

Backzyk não consegue ter a graça de um Leporello, o típico assistente que levanta as piadas para o seu patrão. Do mesmo modo, as projeções usadas são inapreensíveis sem o estudo do programa, algo indesejado.

Uma das boas ideias de Icke, porém, está no primeiro ato, na famosa cena em que Leporello mostra a Dona Elvira a lista de mulheres com quem seu patrão se relacionou.

O encenador vê ali pretexto para reproduzir um divertido desfile de miss no palco. De certa forma, esse desfile reúne ali a repulsa e a identificação gerada por Dom Giovanni, administrando sua perfeição e imperfeição, natureza e humanidade.

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