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Cuide-se
Ciência, hábitos e prevenção numa newsletter para a sua saúde e bem-estar
O açúcar não causa vício como a cocaína ou outras drogas. Por mais que essas comparações circulem nas redes sociais, não há evidências científicas concretas de que o alimento seja viciante.
Entenda: o consumo de açúcar ativa mecanismos de recompensa do cérebro, que geram sensação de prazer e fazem com que as pessoas queiram consumir mais e mais.
Porém… O conceito de dependência aplicado à ingestão de alimentos não é consenso científico. De acordo com especialistas que ouvi para esta newsletter, não dá para comparar o consumo de açúcar ao uso de drogas.
Ficar sem açúcar não gera crises de abstinência, dificuldades nas relações pessoais ou no trabalho, nem afeta outras questões sociais como a dependência química.
- Você já viu alguém comendo colheres e colheres de açúcar puro sem conseguir parar? Imagino que não.
Além disso, esse sistema de recompensa no cérebro, que envolve a liberação de neurotransmissores que geram bem-estar, é ativado quando fazemos exercício físico, por exemplo —e a maioria das pessoas não está “viciada” em exercício.
Por isso, não é preciso extinguir o açúcar da dieta. Fazer isso, inclusive, pode dificultar sua relação com o alimento.
- “Quando você se proíbe de comer determinado alimento gostoso, a tendência é sentir mais desejo por ele e acabar exagerando quando se autoriza”, diz a nutricionista Sophie Deram no livro “Pare de engolir mitos” (Sextante).
O descontrole ao comer pode gerar uma culpa enorme que traz prejuízos, explica Deram, que é pesquisadora em neurociência do comportamento alimentar.
Então, onde está o problema? No consumo em excesso. A Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta para a ingestão exagerada de açúcar e faz recomendações:
- Adultos e crianças devem reduzir a ingestão de açúcares livres —aqueles adicionados a alimentos— para menos de 10% das calorias totais do dia;
- Essa redução seria melhor ainda caso se mantivesse abaixo de 5% das calorias ingeridas no dia, de acordo com o órgão.
Considerando uma dieta de 2.000 calorias, um consumo de 5% do total seria equivalente a 100 calorias ou 25 gramas de açúcar, explica a nutricionista Silvia Ramos, do Conselho Regional de Nutricionistas – 3ª Região (CRN-3).
↳ Uma lata (350 ml) de Coca-Cola tem 37 gramas de açúcar, por exemplo.
Essa indicação de quantidade é a mesma para pessoas com diabetes, diz Ramos. Diferentemente do que muitos pensam, a dieta de um diabético não precisa ser completamente restritiva, mas controlada.
Por que o açúcar deve ser controlado? Um motivo é para evitar o excesso de calorias na alimentação. Outro é que o consumo de doces costuma ter como efeito a ingestão de menos alimentos nutritivos, o que leva a uma dieta não saudável, ganho de peso e aumento do risco de doenças crônicas, como obesidade, diabetes e cáries.
- Vale um alerta especial para as bebidas açúcaradas, como refrigerantes, sucos e achocolatados. Elas não garantem saciedade e são absorvidas rapidamente pelo organismo.
E a indústria alimentícia usa muitos outros nomes para falar de açúcar. Você já deve ter visto nos ingredientes de ultraprocessados: açúcar invertido, xarope de glicose, maltodextrina, glucose, dextrose, xarope de milho rico em frutose… É tudo açúcar.
Devo trocar açúcar refinado por demerara ou mascavo? Se você preferir o gosto, pode trocar. Mas os três têm composição calórica muito semelhante. Para quem quer emagrecer ou reduzir o consumo, o efeito é o mesmo e a troca não faz diferença.
O refinado passa por mais processos químicos para ficar branquinho como é. O mascavo é mais íntegro e o demerara passa por um processo de extração leve de alguns componentes.
Por isso, há algumas diferenças em relação aos nutrientes: o mascavo e o demerara acabam tendo um pouco mais de vitaminas e minerais por causa do menor processamento.
Mas… “Não usamos açúcar como fonte de micronutrientes”, explica Silvia Ramos. “Ou seja, não é um alimento que devemos escolher para ingerir nutrientes. Uma fruta é muito mais interessante para isso.”
Devo substituir açúcar por adoçante? Idealmente, não.
Mesmo sendo zero caloria, os adoçantes causam desequilíbrio na microbiota intestinal e têm impacto no circuito de recompensa do cérebro, de acordo com Sophie Deram.
“Alguns estimulam as papilas gustativas, mandam uma mensagem do sabor doce para o cérebro. Mas o açúcar, as calorias daquele sabor doce não chegam junto. Isso parece causar um efeito rebote que gera mais vontade de comer doce”, explica Ramos.
Eles podem ser utilizados, porém, em casos de pessoas muito resistentes à redução do açúcar, mas que precisam controlar uma questão de saúde, como a diabetes, complementa a nutricionista do CRN-3.
Veja orientações que podem ajudar a reduzir o consumo de açúcar:
1. Aprenda a identificar emoções
A comida pode ser usada para aliviar dores, em um processo chamado comer emocional. É o que acontece quando alguém chega em casa do trabalho ansioso e desconta devorando os doces que vê pela frente.
“É um dos grandes fatores do ganho de peso”, diz Deram. “O comer emocional faz a pessoa a sair do controle e escolher alimentos extremamente energéticos, ultraprocessados, doces. Nesse momento, jamais o cérebro vai querer brócolis ou cenoura.”
É aí que entra a importância de saber identificar o que está sentindo, se reconectar e buscar aliviar as emoções sem necessariamente comer. “Emoção assumida não vira comida”, afirma a pesquisadora.
2. Coma com atenção plena
Vai comer um doce? Pare o que está fazendo e tire o momento para sentir a experiência por completo. Evite comer assistindo à TV, mexendo no celular ou no computador.
“A gente come tão rápido e no automático, não aprecia o alimento e, quando vê, já acabou”, diz Ramos.
Cheire, sinta a textura na boca e mastigue com calma, identificando os gostos. Isso ajuda a reduzir o impulso de comer mais, explica a nutricionista.
3. Acrescente mais frutas, legumes, verduras e água no dia a dia
Estamos falando sobre reduzir o açúcar e uma das soluções é comer mais? Isso mesmo.
Esses grupos de alimentos dão mais saciedade e ajudam a diferenciar o que é fome do que é vontade, de acordo com Deram. Assim, você come o doce quando realmente estiver desejando-o.
4. Evite proibições
Reorganizar a alimentação sem proibir nada é uma estratégia, porque as pessoas passam a ter permissão para comer, diz a nutricionista e pesquisadora.
Como não existe a restrição, aquele momento de “enfiar o pé na jaca” não acontece –ou é muito menos frequente. “A pessoa pode ou não comer. Aí começa uma vida mais suave, mais tranquila frente aos alimentos”, afirma Deram.
5. Busque ajuda
Se estiver com muita dificuldade em reduzir o consumo sozinho, procure um médico, nutricionista ou psicólogo. A ajuda profissional pode ser um diferencial para mudar sua relação com a alimentação.
O que você precisa saber
Notícias sobre saúde e bem-estar
‘Ozempink’. Empresas que comercializam suplementos alimentares, alguns voltados ao emagrecimento, têm tentado registrar marcas com nomes similares a medicamentos como Ozempic, Mounjaro e Wegovy. Especialistas dizem que, além de confundir, prática pode configurar ilegalidade.
Favoritismo parental. Por mais que pais digam o contrário, um estudo da BYU (Universidade Brigham Young), nos EUA, indica que mulheres, caçulas e crianças mais agradáveis e responsáveis são favorecidos pelos pais. Isso pode impactar a saúde mental dos filhos, mesmo que de forma inconsciente.
Barreiras à saúde mental. Apenas 6,9% das pessoas com transtornos ou dependentes de drogas recebem tratamento eficaz para seus distúrbios, segundo uma pesquisa feita pela University of British Columbia e pela Harvard Medical School.