Não dá para negar: Trump fez o L

Caro leitor,

Antes de qualquer coisa, gostaria de confessar que não entendo nada de geopolítica. Nada. E, por não entender, projeto nos outros minha ignorância dizendo que ninguém entende de geopolítica e que quem diz que estende está mentindo. Um exagero, claro. Mas ô área para atrair picaretas e conspiracionistas, viu? Sei lá. Parece que o orgulho de pertencer ao seleto grupo daqueles que compreendem o intrincado jogo de xadrez dos líderes e das nações torna os analistas especialmente suscetíveis ao ridículo e à paranoia.

Dito isso, Trump. Donald Trump. Que fez o L. E fez mesmo! “L” que, você há de se lembrar das aulas de matemática da segunda (?) série, é o algarismo romano para “50”. Entendeu agora? Uma pena que muita gente, tenho certeza, esteja vociferando contra mim neste exato momento, depois de ler o título e ver a ilustração deste texto, e concluir apressada e equivocadamente que estou fazendo uma análise das consequências do tarifaço contra o Brasil. Não estou. Mas essa é a graça deste espaço: brincar com nossa ignorância, nossas conclusões apressadas, nossos preconceitos, nossa má-vontade, nossas certezas. Esqueci alguma coisa?

Não sei

Se bem que está cheio de gente por aí dizendo mesmo que as tarifas de L% de Trump garantiram a reeleição do Lula. Deusolivre! Toc, toc, toc. Eu, sinceramente, não sei se isso faz algum sentido. Não tenho a menor ideia. E é libertador poder reconhecer isso. Eu – não – sei. Dizer que Trump cometeu um erro ou que o tarifaço politicamente motivado foi uma barbeiragem de Eduardo Bolsonaro é, para mim, o mesmo que dizer que Trump deu um xeque-mate em Lula e no STF. Eu. Realmente. Não. Sei. Até porque ninguém sabe. Ou talvez alguém (o Leonardo Coutinho?) saiba, mas é tanto chute, previsão e torcida disfarçados de análise que, me desculpe, fica difícil separar uma coisa da outra.

Mas eu não podia perder o chiste. Da mesma forma que, aqui, não posso deixar de pegar esta saída e mudar de assunto. É que me aconselharam a não usar o título “Trump fez o L” nesta crônica que também é carta. Disseram que eu complico demais a vida, que as pessoas não vão entender, que ninguém gosta de provocação, que o leitor está melindrado e não se lembra dos algarismos romanos. Que isso e que aquilo. Mas insisti. Em parte porque confio no bom senso do meu leitor e em parte porque acredito que minha vocação é esta: provocar. Com caridade, mas provocar.

Passando recibo

Sei que vou quebrar a cara, que vai ter gente me xingando por causa do título e que às vezes a gente escreve rindo o que os outros leem rosnando. Aliás, esta semana mesmo fui alvo de uma leitura nada generosa e um tiquinho desonesta assim. Lembram do meu texto sobre o documentário “Apocalipse nos Trópicos”, de Petra Costa? Pois então. Nem te conto! Não é que uma da produtoras ou corroteirista do filme resolveu zoar meu texto sem ter lido o que não é uma crítica a um filme que não vi nem pretendo ver, e sim uma confissão dos nossos preconceitos e de nossa incapacidade de ouvir o outro lado. Aff.

Pois é. Eis-me aqui passando esse recibo, mas é importante. Porque as risadas sarcásticas da dona Alessandra Orofino escancaram a triste dificuldade (impossibilidade?) de construir pontes de diálogo com a esquerda. Sei que para você isso não é novidade. Para mim também não é. Mas, se insisto e insisto, é porque faço questão de usar a ingenuidade intencional que cultivo com tanto carinho. E principalmente porque é o certo. O que nos traz aos últimos e mais tensos parágrafos desta carta.

Quase pirei

É que fiquei sabendo que um leitor brigou com a família e os amigos da igreja por causa do meu texto cujo título anunciava a absolvição de Bolsonaro pelo STF. Caramba. Fiquei mal com isso. E pensei e pensei e pensei na minha intenção ao escrever, nos ruídos que são inerentes a qualquer texto e na discrepância entre o leitor real e o leitor ideal. Quase pirei. Quase dei ouvidos ao amigo que certa vez me aconselhou a ser um cronista “normal”, a dizer o óbvio, introdução, desenvolvimento, conclusão, sem recompensas, sem surpresas, sem firulas e malabarismos, sem criatividade e sem arte. Sem riscos. Quase.

A você que se sentiu constrangido ao compartilhar uma crônica de humor achando que fosse matéria, só porque o texto está na Gazeta do Povo, peço desculpas. Principalmente ao leitor que brigou com amigos e parentes. Não era, nunca é, minha intenção. Acontece que realmente escrevo para ser lido na totalidade, do título ao ponto final. Além disso, os títulos ironicamente jornalísticos dos textos jocosos são essenciais para o objetivo deste espaço: fazer com que o leitor se confronte com suas certezas & suposições. E encare a realidade às vezes dura demais do noticiário com a leveza devida. Transformando em crônica heroica o noticiário de cada dia, lembra? Levo isso a sério. Bem a sério.

Um abraço do
Paulo.

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