Richard Dawkins, o ateu mais conhecido do mundo, é um descrente também das teorias progressistas sobre gênero. A ponto de deixar sua posição em uma organização tradicional em defesa do ateísmo por discordar da postura da entidade sobre o sexo biológico.
Na semana passada, Dawkins renunciou ao conselho consultivo da FFRF – (Freedom From Religion Foundation, ou Fundação Liberdade da Religião), depois de denunciar o que chamou de “uma nova religião”.
E ele não foi o único nome conhecido a deixar a organização.
O começo da queda-de-braço
A controvérsia começou em novembro, quando a FFRF publicou um artigo de Kat Grant intitulado “O que é uma Mulher”. Nele, Kat — que utiliza pronomes neutros — rejeita a definição biológica de sexo e afirma que “uma mulher é quem quer que ela diga ser”.
Kat também ataca o “colonialismo”, que seria responsável por uma visão limitada de gênero. “Em grande parte dos Estados Unidos modernos, o gênero é visto pelas lendas das tradições religiosas que foram trazidas por colonizadores europeus”, queixou-se.
Kat é formada em ciência política e direito.
Resposta de biólogo retirada do ar
Em 26 de dezembro, a fundação publicou uma resposta assinada pelo biólogo Jerry Coyne, que definiu o argumento de Kat como uma “tautologia”. Para Coyne, doutor pela Universidade de Harvard e professor emérito da Universidade de Chicago, o significado do termo “mulher” é cristalino e tem base na ciência. “A evidente redefinição de um termo com uma longa história biológica só pode ser vista como uma tentativa de impor a ideologia à natureza”, ele escreveu.
Não levou muito para que o artigo fosse retirado do ar, acompanhado por um pedido de desculpas dos co-presidentes da fundação. “Publicar este artigo foi um erro de julgamento e decidimos removê-lo porque ele não reflete nossos valores e princípios”, disseram Annie Laurie Gaylor e Dan Barker.
No comunicado, a dupla acrescenta que “apoia firmemente a comunidade LGBTQIA+ e os seus aliados na defesa da igualdade, da dignidade e da liberdade de viver sem medo de discriminação por motivos religiosos”.
A FFRF foi criada em 1978 e se apresenta como “a maior associação de pensamento livre” dos Estados Unidos, com cerca de 39 mil membros.
Reação de Dawkins
O biólogo e autor Richard Dawkins, a face mais conhecida do ateísmo contemporâneo, não concordou com a remoção do artigo e a defesa acrítica das teorias de gênero radicais. Para ele, a decisão foi “um ato indecoroso de pânico”, por pressão de “grupos histéricos” que “censuraram” o artigo de Coyne.
“Retirar o artigo do ar sem nem mesmo informar o autor da sua intenção foi um ato de descortesia lamentável com um membro do seu próprio conselho consultivo. Um conselho que eu agora deixo, com pesar”, escreveu Dawkins, na carta em que comunicou a saída do órgão.
Dawkins também afirmou que o artigo de Grant é “tolo” e “não-científico” por ignorar a realidade biológica da diferença entre os sexos.
Outras renúncias
Richard Dawkins não foi o único a deixar sua posição na FFRF depois do episódio.
O psicólogo Steven Pinker, que era membro honorário do conselho da entidade, tomou a mesma decisão. Em 28 de dezembro, o professor de Harvard enviou uma carta à diretoria da FFRF. No texto, Pinker diz que a FFRF “deu as costas à razão”.
“A fundação não é mais uma defensora da liberdade religiosa, mas a impositora de uma nova religião completa, com dogmas, blasfêmias e hereges”, argumentou Pinker.
O próprio autor do artigo removido também deixou a organização. Em uma publicação na sua página pessoal, Jerry Coyne disse que essa não foi a primeira vez que a FFRF agiu dessa forma.
“Na verdade, esta foi a terceira vez que eu e outros tentamos alertar a FFRF sobre os perigos de expandir a sua missão para a arena política. Mas agora está claro que é exatamente isso que pretendem fazer”, criticou.
