• Home
  • Destaque
  • Relação EUA-Brasil teve café sequestrado, troca por trigo e briga diplomática

Relação EUA-Brasil teve café sequestrado, troca por trigo e briga diplomática

A relação comercial cafeeira entre o Brasil e os Estados Unidos –que voltou à tona após o presidente americano Donald Trump anunciar tarifas de 50% sobre as importações brasileiras– já passou por episódios tensos, como troca de acusações, sequestro de café e até uma discussão diplomática em uma festa. Mas também teve momentos de colaboração, quando os países trocaram café por trigo após a crise de 1929.

O consumo de café nos Estados Unidos existe desde o tempo em que o país era uma colônia britânica. No século 19, após a independência, a ingestão da bebida cresceu mais rapidamente. Essa alta do consumo foi uma das principais responsáveis pela expansão da lavoura cafeeira no Brasil, uma vez que, naquela época, os grãos entravam livremente nos Estados Unidos, sem barreiras alfandegárias.

Entre 1821 e 1842, as exportações do Brasil para os Estados Unidos aumentaram de US$ 605 mil para US$ 5,9 milhões, crescimento que se deveu majoritariamente ao café.

A relação entre os países ia muito bem até o início do século 20, quando começou a surgir nos Estados Unidos um movimento de revolta contra a política de valorização do café feita pelo Brasil.

Em 1913, o governo americano abriu um processo para investigar se o Brasil estava infringindo a lei antitruste Sherman. Eles acusavam o país de cercear as vendas do café em todo o mundo, retendo o produto a fim de provocar uma alta artificial do preço.

Como medida cautelar desse processo, a Justiça americana determinou o sequestro provisório de 930.000 sacas de café brasileiro que estavam armazenadas nos Estados Unidos.

O episódio gerou até uma discussão diplomática. Relata o historiador Afonso d’Escragnolle Taunay que, em um banquete da Pan American Society, “o Secretário de Estado, Sr. Philander Knox, proferiu um discurso onde certos tópicos provocaram o imediato revide do embaixador brasileiro presente à festa. Diante da atitude prudente, mas firme, do embaixador Assis Brasil, solveu-se, felizmente, a questão.”

O impasse foi solucionado, a Justiça liberou as sacas apreendidas e o governo americano perdeu o interesse na causa.

Mas a trégua foi momentânea. Em 1925, a campanha contra a política de preços do Brasil ganhou força graças a um reforço de peso: o secretário de Comércio Herbert Hoover –que logo ocuparia a presidência da República, entre 1929 e 1933.

Uma comissão americana composta por diretores e especialistas das associações de torradores de café e de varejistas foi enviada ao Brasil para conduzir uma investigação in loco. Ao fim, concluíram que o país fazia apenas uma política de defesa, e não de valorização especulativa.

Ao final desta década, no entanto, a cafeicultura brasileira sofreria um grande baque. Entusiasmados com os altos preços do mercado internacional, os fazendeiros aumentaram significativamente o cultivo, levando a uma superprodução.

Em meio ao excesso de estoque, o mundo foi surpreendido pela crise de 1929. O preço do café despencou de 22,5 centavos de dólar por libra-peso em setembro de 1929 para 8 centavos em setembro de 1931. Some-se a isso a escassez no crédito internacional, e o resultado foi uma série de falências de cafeicultores.

Enquanto os cafeicultores sofriam com os efeitos da grave crise, e os estoques se acumulavam no Brasil, o governo brasileiro negociou a troca de café por trigo. O Brasil enviou 1,3 milhões de sacas. Em troca, os Estados Unidos entregaram 1,6 milhões de bushels de trigo.

Nas décadas seguintes o café se manteve como principal motor das exportações brasileiras, o que se deve, em grande parte, à política de defesa do produto. No início dos anos 50, dois terços de tudo o que o Brasil exportava era café. Tamanha preponderância gerou um problema: a dependência do café.

A questão foi explorada por Antonio Delfim Netto (1928-2024) em “O Problema do Café no Brasil”, tese defendida em 1959 pelo economista: “O custo social da defesa do café foi muito superior do que geralmente se pensa, pois manteve no mercado produtores menos eficientes e gerou condições muito desfavoráveis ao desenvolvimento industrial.”

Essa dependência perdurou até a década de 1960, quando o governo passou a estimular a venda de outros produtos. Em 1973, o café representava menos de 20% das exportações. Hoje, são 3%. Mas o principal comprador, com 16% de participação nos embarques brasileiros, continua o mesmo: os Estados Unidos.

VEJA MAIS

Rede social de Trump que faz ofensiva ao Brasil anuncia US$ 2 bi em bitcoin

Além da Truth Social, a Trump Media também está lançando a Truth.Fi, uma marca de…

Participação popular contribuiu para definição de prioridades do Orçamento 2026

Os cidadãos mato-grossenses ajudaram a escolher as áreas que devem ser prioridade do Governo de…

Como a Doutrina Trump pretende reconstruir a ordem econômica global  

O retorno de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos marcou uma guinada nas relações…